Uma pedalADA pela América - De Uyuni a La Paz - Bolivia
E de Uyuni seguimos rumo a Potosi...agora com um integrante a mais no grupo...o Sebastian...ele nos acompanhou até Potosi e foi muito bom ter mais um no grupo...se bem que ele ia com tão pouco peso, e por isso tão rápido, que quase que nos encontrávamos apenas no fim do dia...rss...
O caminho até
Potosi foi sim cheio de subidas...algumas acima dos 4000
mts...estávamos seguindo rumo ao altiplano boliviano. As subidas não
eram fáceis, mas as paisagens lindas e as pessoas do interior
simplesmente muito simpáticas, se comparadas aos sítios turísticos,
como o Uyuni.
Foram poucos dias
até chegar a Potosi, mas no caminho já tivemos notícia de um
bloqueio na cidade, era uma greve dos mineiros (em Potosi está o Cerro Rico, uma mina que na época da colonização era responsável por boa parte da prata enviada à Europa e esta mina, ainda hoje em funcionamento) e eles bloquearam todas as saídas/
chegadas da cidade pedindo algumas melhorias. Isso já
durava mais de 15 dias. No caminho já sentimos os efeitos desse
bloqueio, como não passavam caminhões as cidades entre Uyuni e
Potosi já estavam ficando desabastecidas de suprimentos e
principalmente comida. Quase não se encontravam coisas pra comprar,
a não ser o que se produzia no local.
Em Potosi a situação
era grave mas pacífica. No total foram mais de 20 dias de greve e
quando chegamos a cidade já estava bem afetada com tudo isso. Em
teoria não entravam e nem saiam carros e caminhões. As pessoas pra
sair da cidade tinham que caminhar por barricadas até mais de 30
kms. Todo comércio em teoria estava fechado. Na verdade atendiam de
portas fechadas como se fosse algo muito ilícito...
Nas ruas, de forma pacífica, as pessoas se reuniam....principalmente as mulheres, de todas as idades!!!
Tudo nas ruas seguia
clandestino, como que em uma cidade em guerra. As coisas mais simples
se tornavam cada vez mais difíceis de encontrar (como água e cerveja
por exemplo). Todos os comerciantes “clandestinos”, menos as
farmácias, que podiam atender normalmente. As portas estavam sempre
entreabertas, cortinas para não ver o rosto de quem vende,
isso pra se comprar por exemplo uma simples pizza. Tudo como se fosse
algo muito proibido (o que na verdade, nesta situação seria...).
Enfim, foi uma
situação triste, porque não conhecemos nada da cidade, mas também
foi uma experiência interessante. Acabamos ficando mais um dia além
do previsto devido a diarreia generalizada. Um dia comemos uma
empanada muito, mais muito rica na rua (até repetimos) e o resultado
foi uma diarreia das bravas em todo mundo...rss... sem forças
tivemos que ficar um dia mais pra recuperar um pouco.
Nesta noite a mais
que ficamos, acordamos pela madrugada assustados. Escutávamos sons,
como que de bala, ou rojões, muito altos. Olhamos pela janela e do
lado de fora tudo apagado, e nas ruas barricadas queimando...as vezes
pessoas correndo e gritando coisas. Tive um pouco de medo. Neste
momento vi que a situação, que parecia pacífica, não era tanto
assim. Tivemos a certeza de que o melhor mesmo era sair dali no dia
seguinte, ainda que não conseguíssemos ir pra muito longe... e
assim fizemos.
Na saída, inúmeras
barricadas, mas sempre nos deixavam passar sem problemas. As vezes
falavam algo, mas, como estávamos com bicicleta passávamos sem
muitos problemas. Foram mais de 30 km de barricadas até sair
completamente da cidade. E neste caminho muita gente, inclusive
mulheres com crianças, caminhando, tentando encontrar transporte
para sair da cidade. Foi realmente uma experiência muito diferente.
Barricadas na estrada...
Crianças e mulheres trabalhando nas barricadas...algo normal por aqui!
De Potosí seguimos
rumo a Sucre e logo Cochabamba...
Á sucre foi um
lindo caminho... (tirando que eu ainda estava de diarréia e a cada
10 km parava pra ir ao banheiro...rss...). Voltamos a baixar de
altitudes e voltamos a sentir um pouquinho de calor...pude até
deixar de usar minha jaqueta laranja por uns dias...rss...foi uma
alegria infinita. Outra coisa boa foi encontrar frutas frescas pra
comprar assim na beirinha da estrada...haaa que delícia... coisas que
só os climas mais quentes permitem!!!
“vivendo
dias de inverno tão frios tenho a certeza de que fui feita pra viver
o verão! Saudades dos dias de sol... de acordar e não sentir os
dedos congelados...haaa...o verão!!!”
Nossa alegria de poder pedalar com menos roupas...
Bora ali pro meu castelo?
Sucre
é uma cidade linda...não se parecia em nada com as cidades/povoados
que vimos nos últimos dias. Não sei, não parecia Bolivia. Sucre
é chamada cidade branca.
Tem uma vida cultural intensa. Passamos aí alguns
dias pra descansar e viver dias de cidade...rss.
E também tem mercados cheios de cores...
Ao
final seguimos rumo a Cochabamba. Não estava nos meus planos ir até
aí, mas ao final pensei, porque não?
As
estradas bolivianas são incríveis...passamos por cada uma, que
penso (ainda não conhecia a estrada da morte) que seriam piores que
a estrada da morte. Só vendo pra saber. Bom, seguia ainda mal do
estômago e a Kássia também...estávamos nos acostumando. Era um
dia bem e outro mal...
No
caminho, em uma cidadezinha muito pequena eu tive a minha primeira
experiência de ficar na casa de um padre. Mas este era um padre
muito diferente, Jarek, um jovem padre Polako. Nos recebeu assim de
braços mais que abertos em sua casa, nos deu cama, banho quente, nos
convidou pra ir a missa (uma experiência bem interessante, a igreja
cheia de crianças e ela com seu jeito especial de cuidar das
crianças). Mas também nos convidou pra jantar e até convidou pra
tomar vinho e cerveja...era um padre polako....e por ele mudei um
pouco meus conceitos, ou preconceitos, a respeito dos padres.
Bom,
dia seguinte pé na estrada...apesar da boa vida aí seguimos, mas
ainda a Kássia estava mal, e 30km depois paramos em outra cidade, e
de novo outro jovem padre polako nos recebeu, e muito bem. Nos ajudou
um montão, porque dessa vez eu também fiquei mal...eu e kassia
fomos até ao hospital (o que em nada ajudou), mas só de ter um teto
(e um banheiro por perto) pra passar 2 dias já foi uma ajuda e
tanto.
Os padres testando as bicis...tudo certo pra seguir...
Gracias Thomasz por todo cariño y ayuda cuando nosotras estavamos enfermas!!!
Faltavam
200km até Cochabamba, resolvemos que íamos tentar ir de carona, na
verdade estávamos fracos ainda e melhor seria ir de carro mesmo.
Conseguimos uma carona maluca, quando uma pessoa quer ajudar faz
realmente de tudo pra ajudar. Este tipo nos colocou na carroceria da
sua caminhonete (que já estava lotada), com as bikes e fomos aí, no
maior estilo boliviano de ser, bikes, alforjes e a gente, tudo
pendurado na caminhoneta, por 200km, inclusive pela noite e com frio.
Mas valeu a pena....foi um por do sol lindo que deu pra ver do alto
dessas lindas montanhas bolivianas.
Cochabamba
também me surpreendeu. O clima aqui é perfeito...nem frio nem calor
demais. Muita gente na rua, cidade organizada e
desordenada...rss...sim, os dois em perfeita des
harmonia.
Aí
tive a experiência de ficar em uma linda casa. Praticamente uma casa
de ciclista. O Hacthi, dono da casa, é um americano de 75 anos, já
viajou pelo mundo de bike e ele uma linda pessoa que gosta de ajudar
os viajantes. Há mais de 2 anos vive aí e sempre ajudando aos
ciclistas que por aí passam.
Com
ele tivemos um pouco de contato mais próximo com a cultura e
dia-a-dia bolivianos. Conhecemos seus amigos, um especial o Edgard,
outro no auge nos 70 e poucos e também apaixonado pelas bicicletas.
Tem praticamente um museu em sua casa.
Aí
nesta casa também encontramos muitos outros ciclistas, Jhony
(chileno), que deu uma pausa na sua viagem pra trabalhar aí, José
(Argentino), Elisa (Alemana), o José com algum tempo de estrada, a
Elisa também, mas com mochila, mas depois que conheceu o José,
comprou uma bici e seguiu com ele (adoro essas histórias inusitadas
de amor e bike <3 ). E ainda a gente...eu, a Kassia e o
Ruben...meus companheiros já há mais de um mês. Foi a primeira vez
tantos ciclistas reunidos e foi uma linda experiência.
Arte na casa de ciclistas...Kassia e José!
Alforjes no maior estilo boliviano de ser!
Eu, Jhony, Kassia, Edgard, Ruben, José e Elisa :)
Linda bici de Edgard!!!
Tá pensando o que? Cochabamba também tem cristo ....mas nem se compara ao nosso!!!!
Daí,
ansiosos por chegar a capital da Bolívia, seguimos em bici. Mais
alguns dias de frio de novo, chuva, subidas
impressionantes
e até neve até chegar a La Paz...
No
caminho a La Paz, que conto como foi já já, completei 6 meses de
viagem...e com essa data importante, vem um montão de sentimentos no
peito...mas principalmente um de gratidão imensa de poder viver tudo
isso...
“Não
senti falta das coisas que deixei pra trás neste tempo. Sinto
saudades das pessoas que ficaram. Saber que nenhum dia vai ser igual
ao outro. Aprender que muitas vezes as coisas mais simples são as
mais importantes. Dar valor a tudo, à comida, quentinha ou fria de
cada dia. Sentir saudades do sabor da comida da mãe, da vó, da tia,
mas aprender a encontrar estes sabores nas comidas do caminho. Dar
valor a cada cama quente, a cada abrigo que te ofertam. Dar valor ao
banho quente e aprender, que as vezes, não se pode tê-lo (muita
gente não tem água para muitas coisas básicas) e nem por isso
deixar de ser feliz. Agradecer pelos dias de sol, depois de passar
tantos dias de frio. Agradecer por ser das terras de Minas Gerais, e
por isso, poder subir tantas montanhas sem sofrer tanto. Agradecer
por cada ser que cruza meu caminho, as vezes por horas, por poucos
dias, ou por muitos, cada um trazendo contigo momentos especiais e
aprendizados. Agradecer por ver e sentir tantas paisagens lindas, tão
lindas e distintas que seria impossível escolher a mais bonita, mais
especial. E agradecer pela parte mais importante dessa viagem....as
pessoas”!!!
Bom,
não fazíamos muita ideia de como seria o caminho a La Paz...e as
vezes é melhor assim...a verdade é que saímos de uma cidade com o
clima ótimo, um calorzinho de dia e friozinho a noite, que está a
pouco mais de 2000 metros de altitude e seguimos à uma das cidades
mais altas do mundo, ou seja, a gente ia ter que subir muiiitooo... e
assim foram os quatro primeiros dias de pedal, muita subida, chegamos
à 4.500 m.a.n.m e pra mim foi uma verdadeira conquista (mal sabia eu
que subidas mais fortes ainda estavam por vir).
Deu pra entender como vai ser a subida ou quer que desenhe? rsss
José...lindo menino das montanhas altas da Bolívia...curioso que só ele!!!
Daleeee...é noix....rss...4500...ufa...só de lembrar já canso!!!! :p
Neste
trajeto pegamos um frio danado também, e ainda, de presente um dia
de neve....foi a coisa mais inesperada e bonita dessa parte da
viagem.
Estávamos
dormindo numa escola, e a Kassia acorda de noite e nos chama: “
Chicos, quieren mirar afuera? Hay nieve!!!”
Em pleno mês de agosto eu não esperava viver um dia de neve em
plena Bolívia. Pra mim foi realmente uma experiência
inesquecível.Levantei e fui ver, realmente tava tudo lindamente
branco. E no dia que seguiu, do lado de fora era festa, todos
brincavam com a neve, as crianças, os adultos e claro, a gente
também.
Não
tinha como sair, ficamos um dia esperando a neve se desfazer e ver se
não ia acontecer de novo. E então, no outro dia seguimos à La Paz.
A estrada estava assim, lindamente linda e branca, ainda sob os
efeitos da nevasca.
Vai encarar??
Dia de produção intensiva...muitos filmes, comidas e pulseiras de macramê!!!
Últimos km rumo a La Paz...dale Kassinha!!!
A
chegada a La Paz foi como esperado...um caos...era sábado
mas a cidade
fervia, o “El Alto” é uma loucura de gente e carros pra todo
lado. E a gente ainda erra caminho e passa no lugar mais movimentado
de El Alto. Uma loucura. Mas depois de muito perguntar acertamos o
caminho e aí foi só alegria. Uma descida tremenda até o centro de
La Paz. A cidade fica num buraco, vista de cima é algo realmente
impressionante.
Um mundo chamado La Paz...
Em
La Paz teríamos abrigo, era a famosa Casa de Ciclistas!!! Um lugar
no centro da cidade feito especialmente pra receber as pessoas que viajam de bike (vejam os endereços de todas as casas de ciclistas da América Latina aqui)...aí chegamos e fomos recebidos de braços abertos
pelos muitos ciclistas que aí estavam, inclusive muitos brasileiros....mas
isso é uma linda história a parte, foram dias lindos que passamos
aí, formamos uma turma muito legal e compartimos dias e experiências
muito especiais que detalho no próximo post!!!
Sea - Jorge Drexler
Ya estoy en la mitad de esta carretera
Tantas encrucijadas quedan detrás...
Ya está en el aire girando mi moneda
Y que sea lo que
Sea
Todos los altibajos de la marea
Todos los sarampiones que ya pasé...
Yo llevo tu sonrisa como bandera
Y que sea lo que
Sea
Lo que tenga que ser, que sea
Y lo que no por algo será
No creo en la eternidad de las peleas
Ni en las recetas de la felicidad....
Mais fotos deste trecho da viagem em aqui!!!
Resumo desta parte da Viagem:
Dia
183 - Uyuni a TicaTica – 85km => Hospedagem Escola
Dia 184 – TicaTica a Aguas de Castilla – 75km => Hospedagem
Hostal
Dia 185 – Aguas de Castilla a Potosi – 50km = > Hospegagem
Hostal
Dia 186 e 187 – Potosi
Dia 188 – Potosi a meio do caminho – 76km => Camping
Dia 189 – Meio do Caminho a Sucre – 80km => Hostal
Dia 190 a 192 – Sucre
Dia 193 – Sucre a Chuquichuqui – 55km – Escola
Dia 194 – Chuquichuqui a Quiroga – 63km =>Casa dos Padres
Dia 195 – Quiroga a Aiquile – 30km => Casa dos Padres
Dia 196 – Aiquile – Diarréia
Dia 197 – Aiquile a Cochabamba – 200km – Carona
Dia 198 a 201 – Cochabamba – Casa Warmshowers
Dia 202 – Cochabamba a meio do caminho – 55km => Igreja
Dia 203 – Meio do caminho a Sayary – 38km => Igreja
Dia 204 – Sayary a Japo – 40km => Escola
Dia 205 – Japo a Caracollo – 74km => Escola
Dia 206 – Caracollo – Dia de Neve
Dia 207 – Caracollo a Lauachaca – 60km – Hostal
Dia 208 – Lauachaca a Throlar – 64km – Hostal (Na verdade na
casa de um dono de um hostal, nos alugou um bom quarto bem baratinho
e nos deixou usar as dependencias do seu hotel).
Dia 209 – Throlar a La Paz – 74km – Casa de Ciclistas de La Paz
Quer saber das outras pedalADAs e onde estou agora? Veja aqui no mapa !
Gostou da viagem, quer saber mais e principalmente fazer parte dessa ideia maluca?
Vem aqui e veja como pode colaborar!!! :)
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Bons pedais pessoal e até as próximas!!!
Que loucura essa em Potossi...
ResponderExcluirNieve! Uhuulll!
Muito bom ler seus relatos grande abraço
ResponderExcluirEi Vivi , só agora vi sua mensagem...obrigada...melhor ainda é pedalar tudo isso né?
ExcluirÓtimo caminho pra vc!!!!